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Diário do Povo Braille, primeiro jornal do país para deficientes

Por Miriam Abreu, Portal Comunique-se   11 de novembro de 2001
"Todo o cego intelectual precisa de leitura, como qualquer outra pessoa. O conhecimento, através da leitura, é o bem mais precioso do indivíduo”, disse o professor de História e Geografia do Instituto Benjamin Constant, João Delduque, deficiente visual desde os 23 anos. Delduque é um dos 145.857 deficientes que existem no Brasil (IBGE-1991). Para atender esse mercado, a Rede Anhangüera de Comunicação (RAC) criou o Diário do Povo Braille, o primeiro jornal para portadores de deficiência visual.

Segundo a diretora de Educação da RAC, Cecília Pavani, funcionários da rede faziam um trabalho voluntário de leitura no Centro Luiz Braille, onde muitos deficientes se queixavam da falta de um jornal em braille. “Eles começaram a reivindicar um jornal totalmente feito para eles, com notícias que lhes interessassem. Levei a idéia até a diretoria e demos início ao projeto”, conta Cecília.

Em julho de 2001, a primeira edição do Diário do Povo Braille estava pronta. Foram 200 edições distribuídas entre entidades de apoio aos deficientes, universidades e prefeituras que organizam atividades de leitura coletiva de jornais convencionais. O jornalista Marcelo do Canto foi o responsável pela diagramação do jornal. “A princípio, ficávamos presos às notícias do Diário do Povo. Até que a demanda começou a crescer e percebemos que uma reformulação no conteúdo era necessária”, explica a diretora.

Hoje, sob o comando do editor Glauco Cortez, as pautas são sugeridas pelos próprios leitores. Cecília conta que os deficientes têm mais interesse por matérias voltadas para novidades científicas, tecnológicas, curiosidades no mundo, exemplos de deficientes que, apesar das dificuldades, obtiveram sucesso profissional, e também para os principais fatos do Brasil e do mundo. A equipe se empenha para preencher, de forma interessante, as 50 páginas do jornal mensal. “Depois de sugeridos os assuntos, fazemos uma pesquisa nas principais publicações do país. Quando necessário, produzimos as matérias”, explicou Cecília. Outra pessoa que faz parte da pequena equipe de conteúdo é a psicóloga Fabiana Bonilha, também deficiente e colunista do Diário do Povo Braille.

A RAC investe, mensalmente, R$ 5 mil para produzir o jornal. Segundo a diretora do RAC, a maior dificuldade encontrada pela rede é captar publicidade. “As pessoas acham que deficientes não se vestem, não comem. Precisamos expandir, mas sem publicidade será difícil”, queixa-se.

O deputado federal Newton Lima (PFL-SP) já parecia prever o interesse dos deficientes visuais pela leitura. Ele é autor do projeto de lei nº 3574, segundo o qual torna-se obrigatória a edição de um por cento da edição de livros, revistas e jornais adequados à leitura dos portadores de deficiência visual. “Nada mais justo impor às empresas de comunicação uma porcentagem mínima para favorecer os deficientes”, defendeu Newton Lima. O projeto aguarda votação na Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF).

Os deficientes assinam embaixo dos dois projetos. “Acho a lei e o jornal excelentes idéias. Mas sei que o papel para o braille é caro, custa quatro vezes mais do que o papel normal de jornal. Os empresários vão ficar furiosos”, disse o professor João Delduque.

Mas tantos obstáculos têm suas compensações. Pelo menos para Cecília Pavani. “Vale a pena ver a alegria dos deficientes quando ‘lêem’ nosso jornal. A maioria liga para nos agradecer pela idéia”.

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