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Microempresa investe no voluntariado

Por Jornal Valor - Alexa Salomão   17 de outubro de 2001
As professoras de balé Márcia Del Rei e Patrícia Bassini levaram um susto quando sua escola, a Allegro Ballet, recebeu o Prêmio Parceiros Voluntários 2001. Surpreenderam-se não apenas com o prêmio em si, um dos mais conceituados do Sul do país, mas com o companheiro de indicação. A microempresa gaúcha, de Novo Hamburgo, com três funcionários e faturamento anual de R$ 36 mil, venceu na categoria Empresa, ao lado do grupo siderúrgico Gerdau, que fatura R$ 6,4 bilhões, tem 12 mil funcionários e 18 usinas no Brasil e outros cinco países. "Quando fiz o paralelo, não tive mais dúvida: tamanho não importa. Em matéria de ação social vale a vontade e a organização para fazer", lembra Márcia.

O Gerdau concorreu com um programa de gestão social, que mobilizou uma equipe de funcionários e 17 fornecedores. A Allegro Ballet destacou-se com o trabalho voluntário das proprietárias. Há três anos, Márcia e Patrícia oferecem aulas para 30 meninas de 8 a 13 anos no bairro Redentora, na periferia. Mantêm duas turmas semanais. Malhas e sapatilhas são doadas. Algumas dessas alunas tornaram-se bolsistas na escola e treinam ao lado das 70 outras estudantes matriculadas. A meta é levar a dança a um número sempre maior de crianças carentes, aumentando as turmas. "Depois do primeiro passo, não temos vontade de parar", diz Márcia.

Pequenos negócios podem até não dispor de grandes cifras, reunir centenas de colaboradores ou receber a luz dos holofotes, mas contribuem hoje com significativa parcela dos projetos voltados a crianças e adolescentes carentes. Para se ter uma idéia, dos 1.338 integrantes do programa Empresa Amiga da Criança, da Fundação Abrinq, 47% são empreendimentos de micro e pequeno porte. As grandes empresas respondem por 33% do total, as médias, por 20%.

"Embora não tenha condições de investir recursos vultosos na área social, a pequena empresa pode ajudar a mudar a situação com medidas simples e de baixo custo, beneficiando crianças da comunidade e filhos de funcionários"', explica o presidente da Abrinq, Helio Mattar. A lista inclui prestação gratuita de serviços, trabalhos voluntários e o que a imaginação permitir.

Abrir as portas da empresa para estágios e cursos, por exemplo, é uma alternativa que ganha adeptos. A Escola Mutirão, em Cotia, São Paulo, contribui flexibilizando vagas. A instituição oferece aulas em período integral para cerca de 150 alunos, da educação infantil ao ensino médio. Um terço ganha descontos que podem chegar a 80% do valor da mensalidade. Oito estudantes recebem bolsas integrais. A manutenção de cada um deles custa em média R$ 800,00 à instituição. Na definição do administrador, Marcelo da Rocha Evangelho, a escola faz investimentos no futuro. "Estamos auxiliando na formação de pessoas."

A mesma preocupação está há anos na cabeça e nas ações do proprietário da Doceria Beijinho Doce, Carlos Alberto Amaro. O ponto instalado a alguns quarteirões da avenida Paulista, em São Paulo, prepara e comercializa doces e salgados. É quase uma microempresa. Fatura cerca de R$ 440 mil por ano. Mas todos os meses, repassa à Abrinq o equivalente a R$ 1,00 por quilo de um dos bolos do cardápio. A coleta rende em média R$ 120,00.

Desde que assumiu o negócio há dez anos, Amaro participa de diferentes projetos voltados à profissionalização de adolescentes. Aderiu ao SOS Criança. Empregou ex-internos da Febem. Apostou no Empresa Amiga da Criança. Hoje, atua em conjunto com o Instituto da Criança Cidadã, entidade mantida por empresas do setor de energia. Dos seus 29 funcionários, oito foram encaminhados pelo instituto e têm mais de 18 anos.

Esses jovens começam o trabalho pelos serviços gerais e passam pelas demais funções ao longo de oito meses. Amaro faz questão de assinar carteira e pagar o piso da categoria, de R$ 340,93, com direito a gratificações e demais benefícios. A Beijinho Doce e técnicos do Criança Cidadã pretendem expandir a proposta. Estão formatando um curso de confeiteiro para jovens de 14 a 16 anos, que será ministrado em unidades do instituto. Funcionários que tenham ou não aprendido o ofício na Beijinho Doce já aderiram à idéia. Vão participar como monitores.

"Empresas menores têm potencial multiplicador", avalia o diretor da Origami - Arquitetura de Papéis, Alberto Machado. Seu negócio na capital paulista é de pequeno porte. Tem faturamento anual de R$ 1,2 milhão, mas está vinculada há vários projetos. Recebe estagiários do Programa de Educação para o Trabalho, do Senac/SP. Garante desconto nos serviços para o programa Empresas Amiga das Criança. Cria e produz cartões de comemorações a baixo custo para oito entidades assistenciais voltadas a crianças e adolescentes. A partir do próximo ano, esse "efeito multiplicador" ganha mundo: cartões da Origami passam a constar do catálogo do Unicef.

A empresária Nadia Majid Aguiar está na lista dos voluntários que cedem tempo. Formou-se em fisioterapia, mas dedicava-se a administrar e supervisionar as lojas de confecção Xiquita e Tays, rede da família, em Curitiba, no Paraná. Há seis meses tirou o diploma da gaveta. Queria exercer a profissão, mas dispensava o salário. Optou pelo voluntariado e assumiu como terapeuta na Escola de Educação Especial Primavera, no bairro Tarumã.

O local atende 120 crianças especiais carentes e com deficiências mentais moderadas. A contribuição de Nádia representou a reabertura do ambulatório e a volta de exercícios considerados indispensáveis para amenizar seqüelas no sistema motor.

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